segunda-feira, 18 de julho de 2011

Em coma

Como vim aqui parar?
Que corredor tão estreito… Não gosto desta escuridão que me rodeia e me bloqueia o pensamento e o espírito. Sinto a presença constante da Morte. Este lugar é sufocante, sem ar nem janelas que o possam trazer até mim. Parece que a Vida me abandona lentamente e uma morbilidade se apodera do meu corpo.
Que estranho… o meu corpo pesa. Não obedece prontamente aos gestos que tenciono executar. Dar um simples passo chega a ser desgastante, toma-me as energias. Nunca senti isto antes. É difícil não me deixar invadir pelo desespero. Tenho um vasto corredor a percorrer e mal consigo sair do mesmo sítio. Mesmo que conseguisse andar de forma natural, o corredor parece não ter fim, é uma escuridão tremenda. Onde vai dar?
Estarei a sonhar? Sinto o calor de uma cama, o resguardo de um lençol. Não consigo levantar as pálpebras por mais que tente. Da minha boca não sai qualquer tipo de som. A minha voz esmoreceu comigo na escuridão. Oiço vozes… como que vindas de um rádio mal sintonizado. Às vezes parecem-me familiares.
Não me lembro de nada. Existe apenas um ruído indecifrável que me faz sentir um arrepio mortal. E algumas visões. Algumas dão-me paz e fazem com que consiga ter forças para dar mais um passo.
Meu Deus, que retrato adorável. Nem acredito que me recordo do dia de anos do meu bisavô. Sinto-me bem no seu colo. A sua mão, já frouxa pela idade, segura a minha com uma ternura tal que até hoje esta se entranhou no meu coração. Porque já não estou ao seu colo? Porque choram? Ele está deitado no caixão. Choro também porque a chucha caiu da mão da minha avó na altura em que tremia convulsivamente ao ver o corpo inerte do seu estimado pai. Porque está o meu bisavô a fazer com que tanta gente chore? Porque não vem pegar na minha mão e levar-me a passear, ensinando-me a dar passos mais concisos e menos vacilantes? Afinal, tenho de aprender a andar melhor.
Esta escola é enorme. Mãe, acho que quero voltar para casa. Disseste-me que o primeiro dia de escola seria alegre, mas estou a achar isto um pouco aterrador. E se me perco? Leva-me a almoçar a casa dos avós.
Sim, o ano correu muito bem, obrigado. Ainda estou a pensar no curso que hei-de tirar. Tem de ser um de que goste realmente. Ainda tenho três anos antes de chegar à faculdade.
Bem, o primeiro ano já está concluído! É necessário festejar. A vida académica ainda mal começou e acabará sem darmos por isso. Que ano trabalhoso. Sair? Porque não?
Já chega. Já bebeste demais, vamos embora. Se te mandam parar na estrada, estás metido numa bela alhada. Olha-me aquela… também está bonita. Vamos lá embora. Vai com calma, está a chover. Não, não tem piada. Não se riam vocês!
Sinto vontade de chorar! Este ruído é horrível, não sai da minha mente! Este corredor sem fim está a absorver-me! Quero ir ter com a minha família e com os meus amigos, já chega deste pesadelo.
Já não sei o que sinto. Já não me sinto. Já não sinto.
Quem está aí? Bisavô… és tu? Porque nunca mais vieste ter comigo? Eu não consigo sair deste corredor. Que bom, trazes contigo uma luz.
Que som é este? É o barulho estridente de uma máquina… antes dava réplicas do bater de um coração. Que berros são estes? Porque está tanta gente a gritar? Foi apenas uma máquina que parou. Oiço os meus pais e os meus avós a chorar. Tenho medo. Não compreendo toda esta agitação. Sinto-me fria por baixo do lençol.
Podemos sair daqui? Ensinas-me a andar novamente?